A problemática da accountability na formação continuada de líderes e gestores escolares
Almerindo Janela Afonso
Accountability é mais do que responsabilização.
No campo das ciências sociais e humanas, em geral, e no campo educacional, em particular, é frequente e normal a polissemia dos conceitos. Nas últimas décadas, esse fato tem sido ampliado por causa das diferentes ressignificações que podem ser imputadas, em grande medida, às mudanças culturais e políticas que provocaram alguma erosão de fronteiras e uma certa desvalorização da historicidade da linguagem. Do meu ponto de vista, é o que está ocorrendo com o termo accountability. Por isso, torna-se necessário clarificá-lo para que possamos avançar na compreensão de muitas políticas educacionais e das suas eventuais alternativas.
A gestão educacional e a accountability
Accountability em educação deve ser entendida como um modelo (ou mesmo, em certos casos, um sistema) que implica a articulação de três dimensões essenciais: avaliação, prestação de contas e responsabilização. Essa é uma das razões pelas quais o termo accountability não deve ser traduzido simplesmente como responsabilização ou como prestação de contas porque, se isso acontecer, não dará conta de toda a sua complexidade, acabando por induzir uma perspectiva conceitualmente distorcida.
É essa visão redutora, aliás, que está frequentemente explícita (ou implícita) em muitos artigos de opinião, em muitos trabalhos jornalísticos e até em muitos trabalhos acadêmicos. Isso pode constatar-se facilmente pelo uso e abuso da expressão “políticas de responsabilização” – expressão que vem contribuindo para descomplexificar o conceito de accountability e, pior do que isso, tem acentuado o caráter negativo das consequências de muitas políticas educacionais baseadas em resultados e indicadores de natureza quantitativa.
Uma formação ética, metodológica e teoricamente sustentada, destinada sobretudo a líderes e gestores escolares, não pode, por isso, deixar de incluir a temática da accountability, independentemente dos olhares disciplinares distintos que possa assumir.
Accountability no Brasil
Desde a era dos governos George W. Bush, quando nos EUA foi criado o programa No Child Left Behind (NCLB), as políticas de accountability têm vindo a assumir um sentido bastante pejorativo por implicarem punições aos professores e às escolas que apresentem maus resultados, obtidos pelos alunos em provas estandardizadas de alto impacto.
No Brasil, ao contrário, ampliaram-se as políticas que atribuem prêmios ou bônus salariais aos professores e/ou às escolas que tenham bons resultados acadêmicos em provas externas. Em qualquer dos casos, embora com ênfases distintas, as políticas de accountability são redutoras porque deixam de lado qualquer prática democrática e dialógica de prestação de contas, tão necessária para aprofundar a participação crítica e o compromisso dos diferentes sujeitos e entidades nos processos educacionais.
Almerindo Janela Afonso
Sociólogo; Doutor em Sociologia da Educação; Professor Associado da Universidade do Minho (Portugal) e Presidente da Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação.
ajafonso@ie.uminho.pt
